O período de distanciamento social ocasionado pela pandemia da Covid-19 tem modificado os hábitos das famílias. Com os adultos trabalhando em home office e as crianças realizando atividades escolares de forma remota, a quantidade de pessoas em casa em tempo integral é mais constante. Essas mudanças provocam efeitos na geração de resíduos nas residências. A empreendedora digital Andrea Barros, que está com os pais, o marido e os dois filhos em casa, fala sobre suas impressões:
“Eu observei que aqui em casa o lixo aumentou durante esse período porque, principalmente, as crianças estão em casa. Está um período de isolamento, não está havendo aula. Então a gente aumentou o volume de comida feita em casa durante a semana. Já aos finais de semana, geralmente, principalmente no sábado, a gente pede alguma coisa de fora pra comer: uma pizza, um pastel etc. Aumentou o volume de alimentação e, por consequência, o lixo também tem aumentado.”
Embora seja essa a percepção de muitas pessoas, um relatório feito pela Abrelpe – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais – revelou que a geração de resíduos domiciliares no Brasil apresentou queda de 6%, em média, entre 1º e 15 de abril.
Em Fortaleza essa redução acompanha o padrão nacional, mas em menor proporção. Foram 2,85% de diminuição nos meses de abril e março em relação ao mesmo período do ano passado. Waldemberg Oliveira de Lima, diretor especial de resíduos sólidos da ACFor – Autarquia de Regulação, Fiscalização e Controle dos Serviços Públicos de Saneamento Ambiental do município, chama atenção para os fatores locais que devem ser considerados ao se avaliar o aumento ou diminuição na produção de lixo, como abrangência, estrutura e níveis de coleta das cidades em relação aos anos anteriores.
Ainda assim, Waldemberg também sustenta que as políticas de distanciamento social do período configuram entre as principais causas na diminuição dos resíduos domésticos na cidade, e diz que elas não estão diretamente associadas aos hábitos de consumo doméstico:
Aumento de resíduos sólidos está ligado ao momento econômico (Foto: Reprodução/Ecotrans Ambiental)
“O primeiro aspecto que a gente deve levar em consideração é o fechamento do comércio. Por mais que, em Fortaleza, as atividades consideradas grandes geradoras são responsáveis por contratar empresas devidamente credenciadas para recolher e dar destinação final aos seus resíduos, muitas atividades se utilizam dos serviços de coleta pública domiciliar. E o fechamento dessas atividades foi responsável pela diminuição da geração de resíduos domiciliar em Fortaleza. A gente percebe isso de forma mais clara quando a gente faz avaliação das áreas que têm forte apelo comercial, como o centro da cidade, várias áreas da Regional 2. Isso acabou impactando na geração de lixo domiciliar.”
Outra característica apontada pelo relatório é que, apesar da diminuição na quantidade total de resíduos, houve um aumento na geração de resíduos recicláveis. O que pode ser apontado como consequência da mudança no hábito das famílias, uma vez que o maior consumo de produtos congelados ou comprados pela Internet, pode acarretar no descarte de materiais como papelão e plástico. Carlos Silva Filho, diretor presidente da Abrelpe, explica que as razões para esses resultados podem estar atreladas ao momento econômico:
“A geração de resíduos sólidos é uma atividade que decorre diretamente do comportamento humano em sociedade. Nós temos analisado uma correlação direta entre geração de resíduos e poder aquisitivo, crescimento econômico. Neste momento da pandemia em que está sendo observada uma restrição do rendimento das pessoas, a gente já percebe isso diretamente na produção de resíduos sólidos. De um lado uma redução na geração geral de resíduos, e por outro lado um aumento considerável na fração reciclável.”
Comércio fechado no centro de Fortaleza (Foto: Beatriz Farias/ SVM)
Outra explicação para o aumento de resíduos recicláveis na coleta pública está no fato de que a atividade dos catadores também diminuiu após o início do distanciamento social. Foi o que observou a dona de casa Mayara Saldanha:
“Há uma separação dos recicláveis com os outros lixos que não são recicláveis. Só que, geralmente, aqueles catadores, aquele pessoal que faz essa coleta separadamente, não estão passando com tanta frequência devido a essa situação. Aí, às vezes, acaba que quem leva é o caminhão do lixo mesmo, a coleta que tem dia de terça, quinta e sábado.”
Sobre a separação dos resíduos, a Abrelpe faz duas orientações. Nas residências onde houve casos positivos para Covid-19 ou suspeitas da doença, não se deve separar o lixo doméstico para coleta seletiva de recicláveis. Todos os resíduos devem ser descartados em um mesmo recipiente, acomodados em dois sacos plásticos, um dentro do outro. Para os casos em que não há confirmação nem suspeita da doença, a recomendação do relatório é que a separação dos recicláveis seja feita normalmente.
Reportagem de Gambit Cavalcante com orientação de Raquel Dantas e Igor Vieira
