A eletricidade, o telefone e a internet são alguns dos elementos que facilitam a vida da sociedade. Mais do que isso, essas descobertas são frutos de anos de pesquisas científicas e representam o contínuo avanço da ciência. Em 2016, segundo o Censo do Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil (DGP) divulgado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o número de pesquisadores em atuação no Brasil aumentou 11%. Ao mesmo tempo em que o número de pesquisadores e pesquisas cresce, o investimento diminui. O orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) em 2016 (R$ 4,597 bilhões) foi cerca de 50% menor do que em 2014 (R$ 8,943 bilhões).
De acordo com o ranking do Scimago divulgado no ano passado, o Brasil ficou entre os 15 países que mais produzem ciência no mundo. Foram 73.697 estudos novos publicados ao longo do ano, ou seja, 200 estudos por dia. Entretanto, uma notificação emitida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) comunicava ao Ministério da Educação a suspensão de 200 mil bolsas de pós-graduação a partir de agosto de 2019. A partir disso, uma onda de protestos espalhou pelo País a importância da pesquisa, como a campanha #ExistePesquisanoBr.
Lançada no Twitter pelas pesquisadoras e pesquisadores, o intuito era valorizar e compartilhar o que é pesquisado no Brasil. Imediatamente, o presidente Michel Temer declarou que as bolsas da Capes não serão cortadas, no entanto, ele tem até hoje (14) para sancionar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) referente a 2019. O governo já sinaliza a redução de 11% no orçamento do Ministério da Educação (MEC).
Avanços
A pesquisa tem contribuído ativamente para dar respostas imediatas às demandas da sociedade. O surto de vírus Zika que teve início em 2015 é um exemplo a ser citado, conforme explica o professor e Pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da UFC Antônio Gomes. “A pesquisa conseguiu dar uma resposta rápida em dois ou três anos para as terapias e o entendimento da doença, agora vacinas estão sendo testadas por conta desses estudos”, afirma.
Outro exemplo é a pesquisa da bióloga cearense e mestranda em Ecologia pela Universidade de Brasília, Laís Brasileiro. Bolsista do CNPq, Laís realiza um estudo que trata do uso de modelagem computacional para simular mudanças do uso da terra e como isso impacta na perda do ecossistema. “Devemos conhecer a nossa biodiversidade para implementar políticas de preservação, ainda mais no Brasil que tem uma área enorme e pouco se conhece o que a gente tem”, explica.
Investimentos
Os investimentos têm sido reduzidos em todas as áreas e agências de fomento à pesquisa. O valor aprovado para a Capes neste ano (R$3,94 bilhões) é cerca de metade do dinheiro empenhado em 2015 (R$7,77 bilhões) — e o montante ficaria ainda menor no ano que vem. O relatório Pesquisa no Brasil, disponibilizado pela Clarivate Analytics à Capes revela que todas as 20 universidades que “mais produzem conhecimento científico relevante” no País são públicas.
A professora do Curso de Ciência da Computação da UFC e Secretária Regional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) no Ceará, Cláudia Linhares, destaca a importância da realização da pesquisa brasileira. “A doença de Chagas ou a Febre Amarela são exclusivamente doenças nossas, a pesquisa brasileira vai encontrar soluções para os problemas e demandas que apenas nós temos, como a extração do pré-sal, por exemplo”, aponta. Segundo a secretária regional da SBPC, 80% da pesquisa científica no Brasil é feita especificamente nos cursos de pós-graduação.
Émerson Miná está no quarto ano do Doutorado em Engenharia e Ciência de Materiais pela Universidade Federal do Ceará, e estuda as problemáticas focadas na Indústria do Petróleo e Gás. “A ideia é propor soluções de baixo custo para o transporte do petróleo em bacias do pré-sal”, explica.
Anteriormente, Émerson era bolsista da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap), mas hoje integra um projeto específico da Petrobrás. “As reservas do pré-sal estão localizadas a seis quilômetros da lâmina d’água onde fica a plataforma, eu trabalho na soldagem da união dos tubos que fazem o transporte do petróleo e gás”, esclarece.
A bióloga Laís Brasileiro afirma que outras formas de apoio como o investimento privado e de instituições filantrópicas podem ajudar a custear a pesquisa, mas não devem ser a fonte principal. “A universidade tem que se fortalecer enquanto instituição pública para que a gente não seja completamente domada pelos interesses daqueles que vão financiar, o investimento privado não deve ditar os rumos da universidade”, ressalta Laís.
Projeções para o Futuro
Para o professor Antônio Gomes a valorização da pesquisa adentra uma dimensão cultural e não é apenas uma questão governamental, a solução seria a sociedade considerar a ciência como um valor nacional. “Quando a gente perde cientistas, eles vão contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico de outras nações”, explica. Para ele, o cenário no Ceará é bem mais animador e o orçamento do ano de 2018 aumentou em relação a 2017.
A professora Cláudia Linhares acredita que a pesquisa no Brasil evoluiu bastante, em termos de pessoal e infraestrutura, mas aponta outros problemas. “A Emenda Constitucional 95, que estabelece o teto dos gastos públicos, impede o aumento de investimentos na educação. Por mais que o PIB e a economia cresçam, a gente continuaria na mesma situação durante 20 anos”, enfatiza.
Outras instituições apontam o prejuízo da redução dos investimentos em pesquisa futuramente no Brasil. Em uma carta aberta divulgada ainda em agosto de 2018, o CNPq alerta que o corte previsto de cerca de 33% (ou 400 milhões) do orçamento poderá limitar o lançamento de editais e contratações de novo projetos.
Matéria feita por Karoline Sousa com orientação de Carolina Areal