Ouça "Festa de Iemanjá resiste ao racismo religioso pelo Brasil" no Spreaker.
O canto vem da Bahia e ressoa pelo Brasil. Mas o culto a Iemanjá é de mais longe, no espaço e no tempo: cruzou o oceano, trazido como herança dos ancestrais, por negros africanos escravizados. Iemanjá era cultuada nas proximidades do rio Ogum, na Nigéria, como uma divindade dos rios. A reconstituição histórica é do antropólogo Jean dos Anjos:
"E aqui ela começa a ser cultuada na beira da praia. É na beira da praia que esses homens e essas mulheres se aproximavam mais do continente africano. Também em lagoas, em rios, no interior do Brasil."
A violência da escravidão também atingiu a religiosidade africana no Brasil. O culto a Iemanjá era em lugares aonde a polícia não chegaria e era escondido no mesmo dia da Padroeira local.
Por isso, Iemanjá tem vários dias de festa no calendário brasileiro do candomblé e da umbanda, explica o antropólogo Jean dos Anjos:
"Enquanto se cultuava Nossa Senhora, esses homens e mulheres veladamente cultuavam Iemanjá, que foi significada como a grande Mãe dos Orixás. Iemanjá foi por muito tempo ligada a Nossa Senhora da Conceição, então no dia 08 de dezembro existem festas de Iemanjá em cidades como Belém, João Pessoa, Recife. No dia de Nossa Senhora dos Navegantes tem festa de Iemanjá em Porto Alegre, que é no dia 02 de fevereiro. Como no dia 02 de fevereiro é dia de Nossa Senhora das Candeias em Salvador, no Rio de Janeiro dia 15 de agosto é dia de Nossa Senhora da Glória se celebre Iemanjá. Aqui, em Fortaleza, dia 15 de agosto se celebra Nossa Senhora da Assunção."
Em Fortaleza, alegria e resistência se fizeram pela mãe de santo Júlia Barbosa Condante, na distante Praia do Futuro da década de 1950. Louvores, danças e presentes são ofertados à Rainha do Mar.
"E aí é uma festa muito importante porque festa da alegria, mas também é a festa da resistência dos povos que cultuam orixá, dos povos que cultuam caboclos, são umbandistas, são candomblecistas que resistiram a essa repressão do estado brasileiro. Durante mais de cinquenta anos ela resiste como festa pública em espaço público, diante de todo o racismo religioso."
A Festa de Yemanjá, em Fortaleza, foi reconhecida como Patrimônio Imaterial em 2017.
Reportagem de Ana Mary C. Cavalcante