Humor inconstante, grande dificuldade em se relacionar, autoimagem distorcida e um forte medo do abandono. Essas podem ser algumas das características das pessoas que vivem com Transtorno de Personalidade Borderline (TPB), também conhecido como transtorno de personalidade limítrofe.
O Transtorno Borderline pode acompanhar a pessoa durante toda a vida, como explica João Ilo Barbosa, professor do Departamento de Psicologia da UFC (Universidade Federal do Ceará):
“É um tipo de transtorno do comportamento, um transtorno mental que, sendo de personalidade, significa que seria um problema que ocorre desde pequeno. A pessoa não tem uma mudança brusca no comportamento dela. Ela sempre teve aquele comportamento. Hoje a gente entende esse transtorno de borderline como uma pessoa que tem características bem específicas, que são constantes. A pessoa oscila muito em termos emocionais. Então ela vai rapidamente da alegria pra raiva, da raiva pra tristeza e uma dificuldade muito grande na interação com as pessoas, porque ela cria uma certa dependência.”
Muitas vezes confundido com a bipolaridade, o transtorno limítrofe se diferencia pela rápida inconstância de sentimentos. Enquanto o paciente com bipolaridade pode passar dias em depressão e alterar para um estado de euforia, que pode durar outro período longo, as emoções do paciente borderline duram apenas algumas horas. Quando muito, um ou dois dias. Qualquer atitude falha que parta de outra pessoa, mesmo que pequena, pode desencadear um turbilhão de sensações no indivíduo com TPB. E a admiração e o amor rapidamente se transformam em raiva e frustração. Mas quais seriam as causas desse transtorno? Quem responde é o professor João Ilo Barbosa:
“É difícil especificar. O que se sabe hoje em dia é que parece ter bastante relação com o próprio histórico das pessoas, principalmente no componente familiar. Quer dizer, há um histórico de dificuldade na interação, a interação familiar, onde os sentimentos não são claros. Então a pessoa faz confusão entre os sentimentos. Ela não consegue definir muito bem o que seria cada um dos sentimentos.”
Ainda segundo o professor da UFC, o diagnóstico se dá de forma clínica. O acompanhamento pode ser feito com psicólogo ou psiquiatra, ou mesmo pelos dois profissionais. As dificuldades no diagnóstico se dão por causa da semelhança que o limítrofe tem com outros transtornos, como o de ansiedade, o depressivo e ainda o transtorno bipolar.
A regente de coral Jéssica Santos foi diagnosticada com personalidade borderline em 2016. Ela passou por diversos médicos, inclusive neurologistas, antes da descoberta do transtorno:
“Antes do tratamento, eu sentia algumas emoções muito exacerbadas e eu me sentia diferente dos outros, porque coisas que são muito pequenas pra outras pessoas são enormes pra mim. E eu nunca soube lidar com isso. Então, quando as pessoas falavam que eu era muito exagerada, ou que eu estava fazendo tempestade em como d’água, aquilo me machucava muito e ficava dentro de mim. E isso me fez muito mal. Porque eu não aprendia a lidar com as coisas que eu sentia. E a maior dificuldade era lidar realmente com as outras pessoas.”
O propósito no tratamento é que a pessoa aprenda a lidar com as próprias dificuldades, adquira autoconhecimento e melhore a interação com as outras pessoas.
Caso você conheça alguém que necessite desse tipo de ajuda, a recomendação do professor João Ilo Barbosa é encaminhar a pessoa para um profissional, para que seja iniciado o tratamento. Jéssica Santos conta que, em casos já diagnosticados, o apoio da família e dos amigos é fundamental. Para ela, um dos maiores desafios é o estigma que as pessoas que precisam de ajuda psicológica carregam.
“Pessoas que têm algum transtorno de personalidade ou algum transtorno psiquiátrico são sempre taxadas das piores formas possíveis. Eu tenho passado por isso, já desde o meu diagnóstico. Então pra quebrar esses preconceitos a gente precisa falar sobre isso. Eu já fui taxada de louca... E isso não é legal. Acho que pra ninguém, né?”
Embora não haja estudos sobre o número de casos no Brasil, nos casos mundiais a prevalência de pessoas com TPB pode chegar a 6% da população, sendo que mulheres são as mais afetadas. A Associação Brasileira de Psiquiatria estima que entre 8% e 10% dos diagnosticados cometem suicídio.
Caso você precise de apoio, o Centro de Valorização da Vida (CVV) pode ajudar. Você pode entrar em contato pelo número 141.
Reportagem de Gambit Cavalcante com orientação de Carolina Areal e Igor Vieira