04/09/18

Batalhas de rimas e o cenário Rap em Fortaleza

Realizada mensalmente, a batalha do Dragão acontece no Centro Dragão do Mar ao lado da estátua de Patativa do Assaré (Foto: Divulgação/Luiz Alves)

Um grupo se reúne em volta de duas pessoas para vê-las duelar, enquanto um DJ toca uma batida. A arma escolhida pelos adversários são as palavras. Para ganhar essa batalha, é preciso ter pensamento rápido, agilidade nas palavras e a capacidade de convencer o público e os jurados de que você é o melhor. Essas são algumas das características das batalhas de rimas.

Essas batalhas surgiram junto com a cultura hip hop, nas ruas do Bronx (bairro estadunidense), em que um rapper atacava outro por meio de músicas, as chamadas diss, ou por meio das rinhas de freestyle (estilo livre).

No Brasil não foi diferente, com a popularização do gênero no final dos anos 1980, vieram as batalhas de rimas. Porém, elas só se tornaram mais organizadas e tiveram regularidade em 2003, com a criação da Batalha do Real no Rio de Janeiro.

Batalha de conhecimento x batalha de sangue

A batalha de conhecimento tem como principal objetivo desenvolver rimas dentro de um tema pré-estabelecido pela organização ou pela plateia. Já a batalha de sangue não tem tema e o principal objetivo é atacar verbalmente o adversário e responder o ataque através do freestyle.

Dentro da batalha de sangue há mais duas modalidades: tradicional e bate-volta. Na batalha tradicional, o MC (sigla para Mestre de Cerimônia) tem cerca de 30 a 45 segundos para atacar o oponente, depois o oponente tem a mesma quantidade de tempo para responder. No segundo bloco, os papéis se invertem. Caso haja outra rodada, ela será a última e a que decidirá o ganhador.

No caso do bate-volta, os MC`s rimam 4 versos de forma intercalada até que a batida acabe. Essa modalidade exige pensamento mais ágil. Ela é muito utilizada no terceiro bloco das batalhas tradicionais.

Popularização das batalhas de rima

A internet teve um papel importante para a divulgação das batalhas de rima para lugares fora do eixo Rio-São Paulo. As gravações colocadas no Facebook e principalmente no Youtube, alcançaram várias visualizações e fizeram com que as batalhas deixassem de ser restritas às comunidades. O rapper paulistano Emicida também ajudou na divulgação. Ele foi um dos primeiros MC's oriundos das batalhas que conseguiu relevância na cena musical do Brasil.

Uma das pessoas influenciadas pelo rapper paulistano foi Zica. Ele conheceu as batalhas de rima através da televisão, quando Emicida batalhou com os repentistas Pereira e Sonhador. Antes de assistir essa apresentação, Zica fazia freestyle em cima de batidas de funk, mas, até aquele momento, não sabia que podia fazer o mesmo com o rap . Após treinar rimas em casa, ele passou a participar das batalhas e posteriormente criou a Batalha da Quadrinha que acontece no Cuca Mondubim.

Para o produtor e rapper Erivan Produtos do Morro, as batalhas em Fortaleza estão em alta pelo fato de ainda serem uma novidade. “Os organizadores das batalhas gravam vídeos e depois publicam na internet. Os vídeos viralizam ou ficam com muitas visualizações. As pessoas assistem as batalhas que participaram, tanto os MC`s quanto o público. A partir daí começa um movimento cada vez maior”, explica.

O cenário cearense

Batalha da quadrinha

A Batalha da Quadrinha nasceu pela necessidade de se ter uma batalha que ocorresse toda semana.  Atualmente acontece todas as terças-feiras no Cuca Mondubim (Foto:Arquivo pessoal)

Em Fortaleza, a competição acontece de norte a sul da cidade. A Batalha da Quadrinha (Cuca Mondubim) e a Batalha do Dragão (Centro Dragão do Mar) são alguns exemplos dessa diversidade. As inscrições para esse tipo de evento podem ser feitas no local meia hora antes do início da competição e podem participar até 32 pessoas.

A Batalha da Quadrinha foi criada em 2016 e nasceu da vontade de se ter uma batalha que ocorresse semanalmente. Começou ao lado da estação da Vila Manuel Sátiro, mas por conta da falta de segurança mudou-se para o Cuca Mondubim. Lá, acontecem as duas modalidades de batalha: a de sangue e a de conhecimento. O organizador e rapper Zica explica que não basta rimar, o MC precisa ter coerência naquilo que fala. “A batalha de rima é tipo uma conversa, o MC tem 45 segundos para poder atacar [na modalidade tradicional] e o cara tem mais 45 segundos para responder. Mas ele tem que responder com coerência o que o brother tá falando, não só palavras ao vento”, afirma Zica.

Um exemplo de batalha exclusivamente de conhecimento é a Batalha do Dragão. Realizada mensalmente, a batalha acontece ao lado da estátua de Patativa do Assaré. O mediador é o produtor e rapper Erivan Produtos do Morro. Os duelos possuem regras e os participantes não podem utilizar palavras de baixo calão ou algum tipo de discriminação. “Pra ganhar, tem que ter muito conhecimento. Tem que estudar”, explica Erivan. Instantes antes da batalha são sorteados os temas que os MC`s precisam rimar.

As mulheres no Freestyle

A rapper Rebeca Macedo explica que ainda há um estranhamento por parte dos homens ao ver uma mulher participando de batalhas (Foto: Arquivo Pessoal)

A rapper Rebeca Macedo explica que ainda há um estranhamento por parte dos homens ao ver uma mulher participando de batalhas (Foto: Arquivo pessoal)

A rapper Rebeca Macedo conheceu as batalhas de rima em 2015, através da internet. Dois anos depois, ela participou da Batalha da Ação, que acontece na Praça do Ferreira toda quarta-feira. “A primeira vez que eu decidi participar foi por influência de amigos que, na época, me incentivaram a tentar uma primeira vez, já que fazia um certo tempo que eu acompanhava e estava arriscando algumas rimas”, explica.

Para o imaginário popular, o rap continua sendo um ambiente masculino. Rebeca explica que ainda há um estranhamento por parte dos homens ao ver uma mulher participando de batalhas. “Em nível de freestyle, ambos podem ser respeitados pela sua capacidade. É mais uma questão de preparação e meter as caras mesmo, com certeza queria ver mais mulheres na cena de batalha porque isso seria um grande feito de empoderamento por parte de nós”, defende.

Lêza MC é rapper e uma das organizadoras da Batalha do Jangú, que acontece todas as quartas-feiras no Cuca do Jangurussu (Foto:Arquivo pessoal)

Lêza MC é rapper e uma das organizadoras da Batalha do Jangú, que acontece todas as quartas-feiras no Cuca Jangurussu (Foto:Arquivo pessoal)

Há um ano participando de batalhas, a rapper Lêza MC conta que ainda é comum casos de machismo nas batalhas. “Isso faz com que muitas mulheres deixem de entrar em toda a cena”, diz. Em um ano batalhando, Lêza MC fala que no cenário freestyle de Fortaleza existem poucas mulheres.

Ela é uma das organizadoras da Batalha do Jangú, que acontece todas as quartas-feiras no Cuca Jangurussu. Nessa batalha, são proibidas ofensas que ferem os direitos humanos, como homofobia, machismo e racismo. Para Lêza MC, é preciso aumentar as informações e conscientizar os MC's que estão participando das batalhas. “Acredito que se oferecermos uma visão diferente para as pessoas, conseguimos diminuir esse casos”, explica.

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