Imagine uma Escola de Circo em Fortaleza, aberta ao público, gratuita, onde artistas de outros Estados pudessem observar a capital cearense como referência nos estudos circenses. Essa iniciativa existe no papel desde 2012, com a aprovação da Lei Municipal nº 9.959, que trata da instalação e funcionamento de circos itinerantes na cidade e, dentre outras providências, autoriza o poder Executivo a criar uma Escola Municipal de Circo. Em 2015, o projeto parecia estar mais próximo de ser concretizado. Naquele ano foi aprovado o Decreto nº 13.630, que regulamentou a lei e determinou prazo de doze meses para a entrega da escola. Cinco anos se passaram e artistas da cidade têm questionado à Prefeitura: "Cadê a Escola Municipal de Circo?".
O processo narrado anteriormente foi impulsionado pela sociedade civil. No ano de aprovação do decreto, artistas da cidade articularam o Fórum de Grupos, Trupes e Artistas Circenses Independentes do Ceará. O espaço de representação política que agregou artistas de fora das lonas de circo se somou a outras organizações da classe artística, como a Associação dos Proprietários, Artistas e Escolas de Circo do Ceará (APAECE), para participar do processo de implementação do projeto da Escola. No entanto, ele tem sido lento e até agora não foi finalizado.
A criação da Escola está sob a responsabilidade da Vila das Artes, equipamento da Prefeitura de Fortaleza, gerido pela Secretaria Municipal de Cultura (Secultfor). Somente em 2017, a Vila formou uma coordenação para o que denomina Escola Pública de Circo da Vila das Artes. Desde então, o espaço vem ofertando cursos, parcerias e oficinas de iniciação. Mileide Flores, diretora da Vila das Artes, explica que as escolas que compõem o Complexo Cultural trabalham em dois eixos. Um de formações de curta duração, destinados a públicos diversos, e outro de formações mais robustas, voltadas para o aperfeiçoamento continuado de profissionais da área. "A Escola Pública de Circo Vila das Artes existe enquanto ações desenvolvidas no primeiro eixo desde 2017", explica a diretora.
No entanto, representantes do Fórum de Grupos, Trupes e Artistas Circenses questionam a existência da Escola pela oferta apenas de formações pontuais e atividades descontinuadas. “Ações isoladas não correspondem e não atendem às perspectivas que precisam ser alcançadas quando falamos de uma Escola de Circo em seus objetivos pedagógicos e estruturais", afirma Samara Garcia, artista circense e integrante do Fórum.
Um dos pontos de entrave do processo era a pendência da apresentação dos projetos pedagógico e estrutural da Escola por parte da Secultfor. Essa foi a motivação para reativar os trabalhos do Fórum em 2020. Durante a pandemia, o grupo solicitou a definitiva apresentação dos documentos em reunião virtual com a Secretaria e a direção da Vila das Artes. O encontro com esta finalidade não aconteceu e o Fórum, então, lançou nas redes a campanha Cadê a Escola Municipal de Circo? #escolamunicipaldecircojá.
A mobilização teve efeito. No dia 18 de setembro, a reunião aconteceu. Além do Fórum, participaram a APAECE e instituições que vem acompanhando o processo. Foram apresentados o Plano Político-Pedagógico da escola e as diretrizes das Formações em Arte Circense, "que marcam em definitivo a atuação da Escola Pública de Circo da Vila das Artes, no que definimos como segundo eixo" de formação, segundo Mileide Flores. A diretora afirma que o compromisso é ofertar as condições necessárias para a efetivação da Escola, objetivo que acredita estar mais próximo a partir desta última reunião.
A expectativa segue entre os artistas, que veem na Escola a chance de ter um centro de referência em pesquisa e difusão da arte circense. Iago Domingos também participa do Fórum e vislumbra as possibilidades: “É uma ação que pode ampliar o acesso ao fazer e a fruição para a cidade de Fortaleza. Apresentando uma possibilidade também a pessoas que talvez ainda não compreendam a noção do Circo enquanto atividade profissional, além de movimentar um mercado interno”. Ademais, "a implementação desse projeto pode auxiliar na preservação e no fomento do Circo, e eu acredito que (isso) é dever do Estado", conclui.
Para o Fórum, a realização da Escola segue como prioridade. A artista circense Samara Garcia ressalta: “Vamos seguir com essa pauta, até que possamos reconhecer na Escola Municipal de Circo da Vila das Artes um espaço de referência para a linguagem, na cidade e no Estado”.
Reportagem de Beatriz Gonçalves com orientação de Raquel Dantas