A década de 1970 trouxe uma diversidade de ritmos e gêneros para o cenário da música brasileira: da MPB de Elis Regina e Tim Maia aos dancin’ days e tempo da brilhantina. Na primeira metade da década, uma leva de artistas e grupos brasileiros que cantavam músicas em inglês começaram a marcar presença nas rádios e nos programas de televisão.
Utilizando pseudônimos e nomes estrangeiros, diversos desses artistas alcançaram enorme sucesso no mercado fonográfico, e suas músicas apareciam como temas e trilhas-sonoras de novelas televisivas. Terry Winter, Michael Sullivan e o grupo Pholhas são algumas das principais referências desse movimento de artistas brasileiros que cantavam em inglês.
O professor de História Bráulio Severino Ferreira realizou uma pesquisa sobre a americanização da música brasileira na década de 1970 como Trabalho de Conclusão de Curso na Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Ele explica que as gravadoras nacionais foram fundamentais para a popularização desses artistas:
"Depois que começou, a partir da novela 'Beto Rockefeller', em 1968, a ter a trilha sonora nacional e a internacional, o quê que as gravadoras começaram a fazer, principalmente a Som Livre: para ter um mercado internacional e às vezes até atingir a FM, que estava começando, e os programas mais populares da AM, eles começaram a lançar músicas em inglês. Só que tinha um probleminha: às vezes tinha uma música que fazia muito sucesso lá fora só que o cantor era um desconhecido do público brasileiro e para, naquela época, você importar um disco inteiro, com gravações, era muito caro, então o quê eles geralmente faziam: pegavam cantores nacionais, colocavam um sobrenome internacional neles e lançavam".
O produtor musical Hélio Costa Manso, integrante da banda Sunday na década de 1970, foi lançado sob o pseudônimo de Steve MacLean na época, emplacando sucessos nas rádios e nas trilhas sonoras de novelas. Ele fala o que motivou esse processo:
"A primeira vez que eu usei esse nome, Steve MacLean, foi a pedido de uma rádio que era muito famosa aqui em São Paulo, chamada Rádio Difusora, e eles queriam alguém que pudesse cantar - na verdade, declamar - em inglês e aí eles escolheram o nome de Steve MacLean. E eles me escolheram porque, nessa época, em São Paulo, haviam quatro ou cinco bandas muito importantes que cantavam em inglês: eram Sunday, que era a banda a que eu pertencia, Kompha, Memphis, Lee Jackson e Watt 69. Essas bandas dominavam o fenômeno das domingueiras nos anos 1970, final dos anos 1960. E quando as rádios precisaram de alguém que cantasse em inglês - depois as novelas da Tupi e novelas da Globo precisavam de pessoas que cantassem em inglês para compor as trilhas sonoras - eles foram lembrando da gente, então eu fui o primeiro de quem eles lembraram e deram o nome de Steve MacLean".
Bitão, guitarrista, vocal e um dos fundadores do grupo Pholhas, explica como acontecia a composição das letras das músicas nos primeiros anos da banda, quando os integrantes ainda não falavam inglês fluentemente:
"Nós tínhamos ajuda de alguns amigos que falavam bem inglês, e tínhamos ajuda também de um precioso livro que o meu pai me emprestou, que se chamava 'O Inglês Tal Qual se Fala no Presente'. Era um livro antigo, que ensinava a falar em inglês mesmo, mas tinha uma maneira curiosa de ensinar. Então ele tinha várias frases em português, e depois ele punha a frase em inglês. A gente chegou a pegar muitas frases desse livro e, a partir dessas frases, fazer as letras de músicas dos Pholhas. Isso foi bem no comecinho da banda. Depois, com o passar do tempo, a gente foi estudando inglês e aí foi diferente a coisa".
Bitão fala também sobre o porquê dos Pholhas terem escolhido cantar músicas em inglês desde o começo do grupo:
"Quando a gente formou, cada um de nós gostava exatamente das músicas inglesas e americanas, que é o que tocava mais na rádio na época - a MPB não era como hoje. Antigamente as músicas internacionais é que eram maioria: músicas francesas, americanas, inglesas, italianas, e a gente escutava isso desde criança. Quando a gente formou a banda, o caminho natural das coisas era que a gente tocasse o que nós gostávamos, e foi o que aconteceu. E a gente optou por cantar em inglês exatamente por causa disso. Nos bailes que nós fazíamos, no início da banda, até a gente gravar, a maioria das músicas eram americanas e inglesas, e a gente aprendeu a gostar de cantar dessa maneira".
Alguns dos artistas que fizeram sucesso cantando em inglês na década de 1970 seguem na ativa até hoje, como o grupo Pholhas, que realiza shows por todo o país.
Reportagem de Caroline Rocha com orientação de Carolina Areal e Igor Vieira