22/05/19

60 anos da Revolução Cubana – Parte 2

O Partido Comunista Cubano, fundado por Fidel Castro, é o único reconhecido pela ilha (Foto: Prensa Latina/Reuters)

Ainda hoje, quando se fala em Revolução Cubana, muita gente trata o tema com interesse afetivo e político, seja em concordância ou discordância. A comoção popular acompanha muitas vezes as discussões sobre o assunto, mesmo após 60 anos do movimento. Mas por que esse acontecimento tornou-se marcante? Podemos ter como alguns dos significados, os caminhos históricos e as influências que o período possibilitou.

Para o professor de história da Universidade Estadual do Ceará (UECE), Altemar da Costa, é fundamental entender o contexto em que a Revolução Cubana emergiu. Ele ressalta que a projeção de guerrilheiros cubanos diante dos Estados Unidos é uma das causas da admiração popular:

"O Fidel Castro, o próprio Che Guevara, Camilo Cienfuegos, eles representaram um pequeno país que se dispõe a desafiar uma grande potência mundial [Estados Unidos], caminhando com suas próprias pernas, ignorando a supremacia desse país. E isso fez com que a Revolução Cubana, e o próprio Che Guevara, se tornassem ícones em camiseta nas várias manifestações, durante várias décadas, inclusive em 68, em várias manifestações, como até hoje".

Além das manifestações populares, a resistência cubana inspirou diversos movimentos revolucionários em outros países, como os que ocorreram em continentes americanos. Gustavo Guerreiro, pesquisador do Observatório das Nacionalidades da UECE, cita alguns dos grupos e países que tiveram como base a Revolução liderada por Fidel Castro:

"Essa luta inspirou movimentos como o Exército de Libertação Nacional na Bolívia, que foi aquele que Che Guevara morreu em combate, movimentos na República Dominicana, a própria guerrilha do movimento 14 de julho no Peru, na Guatemala e em diversos outros países. Foram movimentos que se reestruturaram a partir de guerrilhas formadas pelo exemplo cubano, que eram lideradas, inclusive, por ex-militantes de partidos comunistas daqueles países e grupos de esquerda. Tem também a frente sandinista de libertação nacional na Nicarágua, que também se constituiu nessa época, e a própria influência na Venezuela. [...] Então o legado cubano internacional ele se dá muito nesse campo da luta anti-imperialista e anticolonial. Daí o grande incômodo que causa principalmente nas grandes potências como os Estados Unidos".

Em 1989, Cuba se tornou o maior símbolo do modelo socialista, com a queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra Fria. Nessa época, o fim da disputa entre o socialismo da União Soviética e o capitalismo dos Estados Unidos foi interpretado como a vitória do modelo norte-americano.

O turismo é uma das principais fontes de renda cubana (Foto: Pedro Szekely/Flickr)

Segundo o professor Altemar da Costa, boa parte da importância cubana se constrói a partir daí, com a resistência do país. Apesar da vitória do modelo político e econômico capitalista, Cuba permanece com os ideais socialistas. Posteriormente, o sucesso do país se amplia a sistemas básicos como saúde e educação.

"Outra explicação foi a permanência de Cuba nos ideais da revolução socialista, das características de uma economia socialista, mesmo quando ela caiu, em 1989, com o fim do Leste Europeu e do Muro de Berlim. Se acreditava que Fidel cairia logo depois, mas a Revolução mostrou a sua força, conseguindo apoio popular e se impondo, mesmo em situações muito adversas, até hoje. Então é um país que é bastante admirado pela sua força política, como também pelas conquistas dessa Revolução. Cuba tem um dos melhores sistemas de saúde do mundo, um bom sistema de educação, um bom sistema de esportes, é um país que manda médicos para confins e lugares que nem o Médico Sem Fronteiras vão. Então isso talvez dê uma explicação para a dimensão e a importância dessa Revolução e de Cuba para todo o mundo", esclarece Altemar.

Como em todos os países, Cuba é uma nação que também enfrenta seus problemas. Desde 1960, o povo cubano vive com o bloqueio econômico em relação aos Estados Unidos. Esse embargo econômico impede que vários países mantenham relações comerciais com a ilha. A medida influencia diretamente seu crescimento e sua abertura ao restante do mundo.

A jornalista Amanda Sampaio, mestre em História Social pela Universidade Federal do Ceará (UFC), traz um exemplo de como o embargo pode afetar, na prática, a sociedade cubana:

"Cuba tem uma grande feira internacional do livro, que começa sempre no primeiro semestre em Havana, e depois ela sai percorrendo várias cidades principais de Cuba. E na feira, há dois anos ou três anos, muitas edições [de livros] não chegaram ou chegaram atrasadas. Eles publicaram menos livros do que nas edições anteriores porque eles não conseguiram comprar papel para imprimir os livros, por conta do embargo econômico. Eles tiveram que comprar o papel na Indonésia, para poder publicar os livros. Que foi o único país que topou comercializar o papel para a impressão dos livros com eles. Então impacta em tudo que eles precisam negociar e produzir, do que eles precisam comprar de fora. É uma sociedade que tem muitas dificuldades de ter acesso a muitos bens por conta do embargo econômico".

De acordo com o governo cubano, em matéria publicada pela agência AFP, estima-se que os prejuízos do embargo para o país cheguem a mais de 130 bilhões de dólares. O valor tem sido acumulado nas seis décadas de bloqueio.

Mesmo com incertezas em relação à sua abertura econômica, Cuba reafirmou recentemente seu  modelo socialista. O projeto da nova constituição foi aprovado no plebiscito em fevereiro deste ano e passou a valer em abril. Dentre as principais mudanças estão o reconhecimento da liberdade de imprensa e da propriedade privada, além da criação de novos cargos de primeiro-ministro, governador provincial e prefeito. O novo texto não altera, no entanto, o regime comunista e a existência de partido único, princípios presentes desde a Revolução Cubana.

Reportagem de Theresa Rachel com orientação de Igor Vieira e Thais Aragão

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