A oitava e última temporada do seriado Game of Thrones estreou em 14 de abril quebrando recordes de audiência. Segundo a empresa de pesquisa Nielsen, 17.4 milhões de pessoas nos Estados Unidos assistiram ao episódio de estreia na televisão e na plataforma de streaming do canal Home Box Office (HBO).
Sucesso entre o público e a crítica especializada, Game of Thrones foi ao ar pela primeira vez em abril de 2011. Desde então, vem quebrando recordes de audiência a cada temporada, conseguindo reunir milhões de espectadores em frente à televisão nas noites de domingo.
Kah Dantas, professora de inglês e escritora, realizou uma pesquisa sobre a construção narrativa de Game of Thrones em seu mestrado em Literatura Comparada na Universidade Federal do Ceará (UFC). Para ela, o sucesso da série está associado à inovação no cenário de fantasia:
"A princípio, Guerra dos Tronos (Game of Thrones) estreou como uma espécie de divisor de águas em termos de fantasia épica, porque ela parecia não obedecer à ordem da luta do bem contra o mal, em que o bem triunfava no final e todos os heróis sobreviviam. Então além dessa quebra de protocolo, a história, aliada a aspectos extremamente mundanos, tanto em termos de violência, quanto de sexo, quanto de intrigas, tornou esse universo de Guerra dos Tronos bastante singular".
A chegada dos serviços de streaming ao mercado audiovisual trouxe catálogos formados por uma variedade de séries e filmes distribuídos através da Internet. Nesse contexto, plataformas como a Netflix tem conseguido captar um número expressivo de assinantes e sinalizam uma possível mudança no consumo de produtos audiovisuais.
Neste cenário de ascensão dos serviços de streaming, esperar para acompanhar um produto audiovisual semanalmente, como acontece com Game of Thrones, tem se tornado algo raro para alguns espectadores. Isso levanta discussões sobre se a série seria a última a gerar esse tipo de fenômeno global, em que milhões de espectadores se reúnem em frente ao televisor, no mesmo momento. Quem fala sobre essa questão é Marcel Vieira, professor do curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal da Paraíba (UFPB):
"Os serviços de streaming reconfiguraram muito fortemente a relação entre espectadores e os produtos audiovisuais. A principal mudança é sobretudo na relação com a temporalidade do consumo. Séries via streaming tendem a oferecer o conteúdo empacotado em temporadas, convidando então o seu espectador para um consumo excessivo, em maratona. As séries de TV clássicas, tanto de TV aberta quanto de TV a cabo, funcionam numa lógica de temporada - inclusive essa ideia de temporada é uma noção que tem a ver com a época do ano - e elas convidam o espectador a um compromisso. Você tem que estar naquela hora, naquele dia específico para consumir aquele conteúdo".
Para a jornalista Isabela Santana, os serviços de streaming têm gerado um impacto expressivo na maneira de consumir produtos audiovisuais:
"Esse fenômeno do streaming e da Netflix, eu posso dizer que me afetou muito porque agora eu me desacostumei a assistir série semanalmente. Eu fico até me controlando, eu evito assistir série durante a semana, enquanto eu estou trabalhando, enquanto eu estou estudando, porque eu sei que eu não vou ter o autocontrole para assistir só um episódio. Eu vou continuar vendo até eu cansar ou até eu pegar no sono e enquanto der. Eu já fui dormir tarde, já virei a noite assistindo uma temporada inteira de uma vez só, duas temporadas de uma vez só, mas é justamente isso, porque sempre vai ter o episódio lá disponível para você assistir. Você não é forçado a ter que esperar como é o caso de Game of Thrones, porque não tem o episódio, então a gente tem que esperar uma semana".
O professor Marcel Vieira explica que as plataformas de streaming e a televisão tradicional oferecem experiências distintas ao espectador:
"Elas convidam para experiências espectatoriais diferentes. A experiência do excesso, de você ver um episódio atrás do outro é muito diferente da experiência, da expectativa de ver os episódios durante dois meses, por exemplo. A relação que você cria com isso é bem diferente. Por hora, a gente ainda está vivendo um momento em que esses dois modelos estão convivendo, reforçando interesses das grandes corporações, dos produtores de conteúdo, mas também em disputa por um público cada vez mais disperso diante da quantidade absurda de janelas e de produtos audiovisuais disponíveis".
Caroline Rocha, com orientação de Thaís Aragão e Igor Vieira