26/10/18

Pensadores da educação – Paulo Freire

Paulo Freire é o brasileiro mais homenageado da história. Ele ganhou 29 títulos de Doutor Honoris Causa de universidades da Europa e América, além de ter recebido diversas honrarias como o prêmio da UNESCO de Educação para a Paz em 1986 (Foto: Paulo Granchi Sobrinho/Estadão)

Na história do Brasil, grandes personalidades foram essenciais para a construção do meio social e de suas instituições. Seja na política, na economia ou na saúde, por exemplo, pode-se citar nomes que revolucionaram essas áreas e moldaram as perspectivas atuais e de futuro.

Na educação isso não é diferente. Quando se fala nesse âmbito, o nome de Paulo Freire é referência para a metodologia de ensino e aprendizagem. Reconhecido como o patrono da educação brasileira, o pernambucano, que construiu a sua trajetória mesclando a religião e a urgência de educar os mais pobres, é fundamental para se compreender o avanço do processo educacional no país.

Entretanto, Freire e sua obra nunca foram unanimidades. Durante sua vida, ele foi perseguido, exilado e proibido por muito tempo de levar os seus ideais. Atualmente, o seu legado é questionado, com correntes políticas que defendem até a sua extinção. Mas afinal, o que Paulo Freire representa para o entendimento das questões que envolvem o mundo? E por que alguns insistem que o seu pensamento é perigoso?

A metodologia de Paulo Freire

Filho de um militar e de uma dona de casa, Paulo Reglus Neves Freire nasceu em Recife, capital de Pernambuco, no ano de 1921. De classe média, o educador, que também se formou em Direito, tinha a religião como base e os pobres como o seu público de atuação. Foi com os mais carentes que Freire desenvolveu o seu trabalho e proporcionou oportunidades para que as pessoas pudessem enxergar o mundo de uma outra maneira.

Um dos fatos mais importantes de sua vida aconteceu no Rio Grande do Norte. Em 1963, Paulo Freire e um grupo de educadores desenvolveu um método que possibilitou 300 cortadores de cana aprenderem a ler e a escrever em 45 dias. A experiência, tida como revolucionária, apresentou uma nova maneira de educar, além de novos mecanismos que estimulavam os aprendizes a compreender além de palavras e vocábulos.

Freire é o autor de Pedagogia do Oprimido, livro que propõe um método de alfabetização dialético. O educador defende o diálogo com as pessoas simples, indo além do método, mas como um modo de ser realmente democrático. Na foto, Paulo Freire explica o seu método de alfabetização para adultos a professores nas Ilhas Fiji (Foto: Reprodução/Internet)

Freire é o autor de Pedagogia do Oprimido, livro que propõe um método de alfabetização dialético. O educador defende o diálogo com as pessoas simples, indo além do método, mas como um modo de ser realmente democrático. Na foto, Paulo Freire explica o seu método de alfabetização para adultos à professoras nas Ilhas Fiji (Foto: Reprodução/Internet)

De acordo com Nildes Alencar, diretora pedagógica da Escolinha Sol, localizada no bairro Caça e Pesca, em Fortaleza, “os princípios e a visão que Paulo Freire propõe é que a educação é uma ação, uma filosofia e uma missão. A matéria de tudo isso é o homem. E pensar nesse homem, segundo Paulo Freire, é pensar na sociedade. Portanto, a ação concreta da educação em uma visão freireana e cristã é a transformação desse homem e, consequentemente, da sociedade”, afirma.

O pensamento crítico e o reconhecimento social do ser humano são as principais bandeiras de Paulo Freire. Para Ercília Braga, professora do Departamento de Letras da Universidade Federal do Ceará (UFC), “ele acreditava que a qualquer momento se podia aprender a ler tanto a palavra, quanto decodificar o código. Paulo Freire comandou um plano nacional de alfabetização a partir de uma metodologia que parte das palavras do cotidiano. As palavras que são caras ao trabalhador rural se transformavam em temas geradores que eram discutidos. O ler e o escrever era indissociável de pensar a vida. O que está por trás dessa metodologia freireana é uma crença muito grande no potencial humano. Para ele, a educação precisa ser um instrumento de reflexão crítica, que nada tem a ver com doutrinação”, explica.

O impacto de Paulo Freire nas instituições e na sociedade

Não há dúvidas de que o legado de Freire em obras como a Pedagogia do Oprimido e a criação do Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (Mova), por exemplo, são substanciais para se compreender os avanços da educação no país. Contudo, mais do que os seus projetos, o impacto de suas ideias na construção do ensino em escolas e universidades são a materialização de que o educador revolucionou a maneira das pessoas entenderem o contexto social ao redor.

A Escolinha Sol trabalha com essa perspectiva, mas com um público que ainda está na fase inicial do aprender. Com crianças de três a dez anos, a instituição utiliza o pensamento de Freire em sua proposta de ensino. Para Nildes Alencar, existe “uma maneira de trabalharmos juntos. Com a observação, a participação de todos, a reflexão e a decisão final, que é nossa ação. Eu diria que é a pedagogia da reflexão. Isso com os mestres de ensino, com as crianças e com os conteúdos de ensino. Esse é o nosso caminho. Essa é uma metodologia que estimula as fases do conhecimento. Conhecer a matéria, pensar, refletir sobre ela e chegar as conclusões finais”, ressalta.

A Escolinha Sol foi criada pelo Grupo Solidariedade, Operosidade e Liberdade em 2006 e abriga crianças do bairro Caça e Pesca, em Fortaleza. Com o intuito de levar a educação a uma das comunidades mais carentes da cidade, a instituição utiliza os ideais de Paulo Freire para estimular o ensino e é reconhecida com umas das melhores e mais procuradas escolas da capital (Foto: Igor de Melo/Vós)

A Escolinha Sol foi criada pelo Grupo Solidariedade, Operosidade e Liberdade em 2006 e abriga crianças do bairro Caça e Pesca, em Fortaleza. Com o intuito de levar a educação a uma das comunidades mais carentes da cidade, a instituição utiliza os ideais de Paulo Freire para estimular o ensino e é reconhecida com umas das melhores e mais procuradas escolas da capital (Foto: Igor de Melo/Vós)

Já Ercília Braga entende que as ideias freireanas vão muito além da inserção dentro das instituições de ensino. Elas já atingem um âmbito maior, permeando a sociedade. “As ideias de Paulo Freire são de luta permanente. De estar vigilante na defesa dos direitos sociais, sobretudo, daqueles mais vulneráveis. Ele não gostava quando diziam pedagogia do Paulo Freire. Ele gostava que chamassem de pedagogia da libertação, da indignação. É uma proposta de mudança civilizacional. Não é algo que somente se implanta em uma escola porque isso implica em uma mudança de mentalidade”.

Mesmo com esses valores que fazem parte da vida e obra de Paulo Freire e que foram responsáveis pela formação de muitas gerações, alguns grupos políticos acreditam que o seu pensamento envolve uma doutrinação e defendem a volta de uma proposta pedagógica mais conservadora. Fora do país, Freire é reconhecido como uma inspiração para muitos estudiosos. Estes se somam com quem luta diariamente para levar uma educação com qualidade, pensamento crítico e uma visão não alienada das esferas sociais no Brasil.

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