01/10/18

O direito à internet no Brasil é uma realidade?

De acordo com o IBGE, 106,7 milhões de pessoas no Brasil têm acesso à internet. O número é 7,2% maior do que a da pesquisa anterior, realizada em 2015 (Foto: Bruno de los Santos/Fotos Públicas)

É muito comum ouvir que a internet é o meio de comunicação mais democrático que existe. Nessa esfera, os indivíduos podem encontrar conteúdos e opiniões com grande variedade, além de um ambiente caracterizado por debates, mobilizações, novidades e interações. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad C), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano de 2016, 64,7% da população brasileira tem acesso à internet.

Entretanto, apesar do status de democrática, a internet ainda não é acessível a todos. Isso significa que mais de um terço da população brasileira ainda não possui maneiras de utilizar a web como ferramenta de trabalho, diversão, contato e pesquisa. Além da porcentagem de brasileiros online, a pesquisa também apresenta outros valores que apontam que esse meio de comunicação está longe de ser a porta de entrada principal para o acesso à informação.

Os dados e a desigualdade social

Mais do que expor uma situação em que a internet não está disponível para toda a população, é importante perceber qual o perfil do público que não está conectado à rede. Segundo uma pesquisa realizada pela TIC Domicílios em 2017, 70% das pessoas que não têm acesso a web se encontram nas classes D e E. O índice representa uma perspectiva que se espalha por outros âmbitos sociais e econômicos do país, reforçando uma situação de desigualdade.

Helena Martins, professora do curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal do Ceará (UFC) e integrante do coletivo Intervozes, afirma que a internet no Brasil é pensada como mercadoria. “Nós acabamos tendo um cenário de acesso que reflete a desigualdade social no Brasil. É um acesso extremamente concentrado e que é marcado por divisões de raça, de gênero, e também, especificamente, de localidade”, comenta.

A professora ainda acrescenta que “se for considerar qualidade de acesso, a situação é ainda pior. Porque muitas pessoas acessam a rede por meio de celular, sobretudo nos domicílios com menor renda. Então, quando você acessa pelo celular, você tem um acesso limitado, condicionado. Há um limite de franquia de dados. Então, quando a gente pensa em qualidade do acesso, a situação de desigualdade é ainda mais grave”, explica.

O acesso a internet no Brasil é feito, prioritariamente, através de smartphones. De acordo com uma pesquisa realizada pela FGV-SP, no Brasil existem 220 milhões de smartphones ativos. O número é maior que quantidade de habitantes (Foto: Foto: Rogério Uchoa/Diário do Pará)

O acesso à internet no Brasil é feito, prioritariamente, através de smartphones. De acordo com uma pesquisa realizada pela FGV-SP, no Brasil existem 220 milhões de smartphones ativos. O número é maior que quantidade de habitantes (Foto: Foto: Rogério Uchoa/Diário do Pará)

A pesquisa ainda indica que 99% da população de classe A tem acesso à internet. Essa situação também configura outra realidade que dificulta a integração das classes mais baixas com esse meio de comunicação. O custo é uma das principais limitações para o acesso à internet. O preço das conexões de banda larga ainda é muito alto no país, assim como os equipamentos.

Outro fator que também dificulta o uso desse meio de comunicação é a qualidade dos serviços prestados pelas operadoras de internet. Segundo Riverson Rios, professor do curso de Jornalismo da UFC, “se for comparar com países mais avançados, a grande limitação é na velocidade e na qualidade do sinal. O acesso à internet aqui é feito mais por celulares do que em computadores. Entretanto, o sinal do 3G e 4G não é onipresente em todas as cidades do país. Em diversos locais da cidade o sinal é inexistente ou é muito ruim”, afirma.

A internet enquanto direito

Mesmo com o crescimento do acesso à internet nos últimos anos, esse meio de comunicação ainda está em processo para se consolidar enquanto garantia. Para Daniel Maia, professor do Departamento de Direito Público da Faculdade de Direito da UFC, “há uma série de medidas governamentais e também não governamentais para a expansão da internet no Brasil, em especial para pequenos e distantes municípios”.

Uma dessas medidas é a Lei N° 12.965/14. O Marco Civil da Internet, aprovado em 2014, regula o uso da Internet no Brasil e prevê, por meio de regras, os direitos e deveres para quem utiliza a web. Além disso, outros projetos de lei em muitas cidades do país propõem a disponibilização de conexões de internet gratuitas em ambientes públicos.

Contudo, segundo Daniel, ainda “não há uma lei específica prevendo como isso [o acesso à internet] deve ser feito”. Para ele, “a internet em si não é um direito fundamental, mas sim um instrumento de comunicação em massa os quais possibilitam a maximização da troca de informações e conteúdos”.

A troca de mensagens e o consumo de streamings são apontadas como as principais atividades realizadas na internet, de acordo com o IBGE (Foto: Reprodução/Internet)

De acordo com o IBGE, a troca de mensagens e o consumo de streamings são apontadas como as principais atividades realizadas na internet (Foto: Reprodução/Internet)

Por outro lado, Helena Martins acredita que a internet tomou uma dimensão fundamental. “Uma série de atividades importantes na nossa vida são feitas a partir da internet. A comunicação é um direito humano. Todos e todas devem ter esse direito assegurado, devido a centralidade que os meios de comunicação adquiriram na sociedade. A nossa bandeira é que a internet seja considerada como um serviço essencial e como um direito para que a população possa acessar todos os benefícios e participar, efetivamente, dos debates públicos e políticos”, afirma.

Existem movimentos para que a internet possa se tornar uma garantia para toda a população. Entretanto, a burocracia e os interesses de empresas que prestam esses serviços fazem com que a internet caminhe lentamente para uma democratização.

Reportagem de Pedro Silva com orientação de Carolina Areal.

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