"Entender as diferenças não como fragilidades, mas como potencialidades", é com esse pensamento que a bailarina e coreógrafa Andréa Bardawil constrói, há mais de duas décadas, a concepção de uma dança que preza pela diversidade e a autonomia popular. Com formação em dança contemporânea e moderna, esta artista cearense está com o espetáculo Graça na programação da 11ª Bienal Internacional de Dança do Ceará, que acontece entre os dias 19 e 29 de outubro. O evento será realizado simultaneamente em sete cidades cearenses, reunindo 34 companhias nacionais e nove grupos de outros sete países.
Graça foi idealizado por Andréa Bardawil em parceria com Graça Martins, uma dançarina também cearense cuja formação artística se deu na área da dança popular e no flamenco. O projeto, que surgiu em 2010, já passou por mais de 20 cidades brasileiras e será apresentado no Teatro São João, em Sobral, no dia 20 de outubro, às 19h.
A Bienal e a Bardawil
Em 1997, surgia a Bienal Internacional de Dança do Ceará e, nesses 20 anos de existência, a vida de Bardawil e o evento se encontraram inúmeras vezes. Além de já ter se apresentado na programação, a artista também trabalhou na curadoria e na coordenação pedagógica da Bienal. Sua função principal era a de buscar "uma estrutura que favorecesse a formação, o fomento à produção e a circulação da produção local sobretudo, mas também o intercâmbio com a produção nacional e com a produção internacional", afirma.
A Bienal transformou a arte cearense. O evento foi o primeiro no qual a classe da dança local se reuniu para lutar por espetáculos gratuitos. Bardawil conta que grande parte da população "não tinha dinheiro para pagar aulas nas academias" e o surgimento da Bienal desencadeou uma grande mobilização em prol de uma dança mais acessível. Ainda segundo a artista, a democratização do acesso à arte "sempre foi uma bandeira de luta e um objetivo trabalhado" pelas companhias e grupos de dança do Ceará.
Entretanto apesar de algumas conquistas, como a criação do Curso Técnico em Dança e a graduação em dança na Universidade Federal do Ceará (UFC), Bardawil afirma que o cenário da arte local tem "sempre que dormir com um olho fechado e com outro olho aberto", pois "foi com muita briga e com muita organização" que esse projetos viraram realidade. A Bienal foi apenas o estopim para uma resistência popular que se estende até os dias de hoje.
A condição de estar na dança contemporânea
"Você não precisa entender a dança contemporânea para ser atravessado por uma experiência estética". Grande parte das pessoas que vão a um espetáculo de arte espera se deparar com uma história de início, meio e fim. Porém, Andréa explica que a dança contemporânea é uma forma de estremecer essas previsibilidades estéticas que estão arraigadas no pensamento popular.
Quando questionada sobre como um espetáculo que não precisa ser entendido pode fazer parte de uma proposta democrática, a coreógrafa afirma que "a dança contemporânea não é um estilo, ela é uma condição de estar". A questão principal não é o objeto final, mas sim os meios como se estruturam as técnicas artísticas. Por não buscar uma forma estável ou linear para seus processos de produção, a dança contemporânea "tem um acolhimento da diversidade muito maior", afirma a artista. Em um cotidiano de tanta objetividade, buscar sentir e apenas dançar pode ser uma atitude libertadora.
Confira a entrevista* com Andréa Bardawil:
*Esta entrevista foi concedida nos estúdios da Rádio Universitária FM no dia 29 de setembro de 2017.
A seção Entrevista teve produção e apresentação de Otávio Fernandes, operação de áudio de José Raimundo Lustosa, orientação de Igor Vieira e Carolina Areal, coordenação de Caio Mota e direção de Nonato Lima.