O 13 de julho comemora o Dia Mundial do Rock. A data é uma homenagem ao Live Aid, um festival realizado em 1985 neste mesmo dia. O evento foi organizado pelo cantor irlandês Bob Geldof com o objetivo de angariar fundos para a Etiópia, que à época passava por uma de suas maiores "epidemias" de fome. Artistas como U2, Queen, David Bowie e Led Zeppelin participaram dos espetáculos que foram assistidos por cerca de 1,5 bilhão de espectadores em todo o mundo.
Alguns anos após o surgimento do Rock and Roll nos Estados Unidos da América, artistas do mundo inteiro experimentaram influências deste estilo musical. No Brasil, quando se pensa no gênero, nomes como Tim Maia, Erasmo Carlos, Rita Lee e Raul Seixas vêm imediatamente à cabeça. Mas você sabe qual a história do Rock alencarino?
As raízes do Rock fortalezense
Após o "boom" de artistas como Elvis Presley, Beatles, Iron Maiden e Ramones, o Rock não demorou muito para chegar em terras cearenses. Já no final da década de 1970, bandas como Big Brasas e Rataplans e a cantora Mona Gadelha começavam a escrever a história do gênero na cidade.
Inicialmente, o Rock fortalezense se concentrou nos bairros litorâneos. Elegantes clubes promoviam eventos para um público que crescia cada vez mais, mas, segundo Irapuan Peixoto Lima Filho, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e pesquisador do Rock local, esse movimento migrou para as periferias. "Num primeiro momento, a periferia se locomovia até esses bairros [de classe alta] para poder curtir o Rock, as festas e os espaços. Mas depois você tem esse movimento contrário, de os jovens começarem a fazer o Rock no seu próprio bairro", afirma.
Na década de 1980, bandas da periferia apareciam na cena do Rock. Nomes como Repressão X, HLV3+, Estado Mórbido e Resistência Desarmada eram frequentes em apresentações improvisadas pelas ruas da cidade. Enfrentando uma realidade precarizada, estes grupos mais pobres faziam de tudo para tocar. Instrumentos eram emprestados, CD's eram compartilhados, e, de pouco em pouco, o Rock foi se espalhando por Fortaleza.
Paralelo à popularização, as intervenções policiais iam se tornando mais recorrentes. "A gente ia ou de pé ou de trem. Naquela época, não existia metrô e ninguém tinha condição de ficar pagando ônibus, aí a gente pulava a catraca na estação e, na maioria dos finais de semana, a gente tava era preso", lembra Flor Fontenele, ex-integrante da Resistência Desarmada, a primeira banda punk completamente feminina de Fortaleza.
O novo cenário do Rock em Fortaleza
No final da década de 1990, o Rock fortalezense já se mostrava mais estruturado. Em 25 de agosto de 1998, surge a Associação Cultural Cearense do Rock (ACR) com o objetivo de contribuir com o cenário do Rock local através da organização de mostras, shows e pesquisas. Uma das produções da instituição é o ForCaos, um dos maiores festivais de Rock do Nordeste, que ocorre há 19 anos.
A partir dos anos 2000, os incentivos e as facilidades começaram a aparecer timidamente. Simultaneamente à evolução tecnológica, mais bandas surgiram e passaram a se comunicar com maior facilidade, criando uma rede de contatos em todo o Brasil. Pouco a pouco, o Rock foi perdendo o estigma de marginalização, passando a ser tratado com mais zelo tanto pelo Estado quanto pelo público.
Prova disso é que, atualmente, Fortaleza é o berço de inúmeras bandas de renome regional e nacional, como é o caso de Plastique Noir, Ankerkeria, Selvagens à Procura de Lei e Ark of Sin."O estado do Ceará é uma referência em termos de Rock and Roll. Embora seja conhecido como a terra do forró, o Rock é muito presente, existem cerca de 400 grupos aqui", diz Amaudson Ximenes, presidente da ACR.
Apesar do cenário do Rock local ter se tornado mais democrático, alguns obstáculos persistem ao tempo e dificultam a rotina de quem traz o Rock como estilo de vida. Márcio Benevides, pesquisador, professor do Centro Universitário 7 de Setembro e idealizador da Black Knight Frequency, afirma que o Rock fortalezense ainda "tem muita coisa para evoluir, em termos mercadológicos ainda é uma coisa muito limitada".
Conheça essa e outras dificuldades na entrevista com Márcio Benevides:
Influência feminista
Historicamente, o número de mulheres no Rock é pequeno em comparação ao de homens. Em se tratando do cenário cearense, são vários os casos de machismo. "Já vi meninas serem criticadas porque estão cantando e tocando em uma performance e, de repente, tiram a blusa ou o seio fica à mostra, e elas são criticadas, chamadas de vagabundas. Isso é um absurdo, o Rock é transgressão e é preciso que as pessoas se adequem e acompanhem os tempos", ressalta Flor Fontenele, ex-integrante da Resistência Desarmada.
Apesar das dificuldades e dos casos de machismos, uma parcela feminina do Rock cearense mostra que o feminismo tem levado mais mulheres a se empoderarem no meio musical local. Joice Lopes, vocalista da Ankerkeria, afirma que o feminismo acabou se tornando parte integral da banda. "Notei o quanto a mulher é rebaixada e menosprezada tanto pela religião quanto pela cultura popular em geral, transformando as nossas músicas e audiovisual em um ponto de contra cultura, empoderamento e de repúdio a toda instituição que contribui para manter as mulheres oprimidas e sob controle de uma sociedade retrógrada e moralista", afirma.
Confira a entrevista com Flor Fontenele na íntegra:
Após décadas de luta e resistência, o Rock de Fortaleza cresceu e se tornou uma importante vertente da cultura local. Atualmente, o estado do Ceará é referência nacional quando se trata do gênero. Com cerca de 40 anos de história, este estilo de vida, que remete à subversão de valores e rebeldia, ganha cada vez mais os ouvidos e corações alencarinos.